quinta-feira, 23 de abril de 2009

O Vendedor de Balas

Sua mãe sabia de sua existência logo nos primeiros dias da gestação.
Ele já era inquieto.
E nasceu numa família que o amava, o vendedor de balas.
Tinha uns problemas de fala, outros de compreensão, alguns ósseos e muitos, muitos desejos reprimidos naquele corpinho pequenino.
Os pais sempre preocupados levavam o menino-vendedor de balas a hospitais e médicos e parques e praias e tudo para que ele crescesse saudável.
E ele sempre foi inquieto, mesmo quando não conseguia falar ainda.
Cresceu. Saudável. Forte. Tem dores aqui e ali, como todo mundo. Mas ele é vendedor de balas, precisa passar o dia inteiro em pé na rua, não pode reclamar.
Reclama, porque todo mundo reclama, ué. Ele também reclama.
Das dores físicas, dos amores perdidos, dos amores não tidos, dos amores inventados, das vontades ainda reprimidas.
Ele nem sempre foi vendedor de balas.
Já foi lutador, já foi nadador, já foi estudante, já foi moleque sorridente e tinha até gente que dizia que ele nasceu pra ser presidente!
Mas ele dá ouvidos a todo mundo que não sabe o que quer da vida, ele ainda não sabe se ouvir e resolveu sair pra viver.
É, a família prendia demais, não deixava ele ser o que ele queria ser. Aí ele saiu.
E foi ser vendedor de balas.
Não tem mais a cama confortável nem quarto exclusivo como tinha na casa dele. Não tem mais comida quentinha na hora que quer nem todas as bolachas do armário pra ele.
O telefone sem fio e de longo alcance ele trocou por um orelhão e nem se preocupa com isso.
Não tem internet como tinha, não tem abraço como tinha, não tem preocupação de todos com ele como tinha.
Ele até sente falta das noites de bagunça com a família e amigos, mas tem uma coisa que ama mais do que isso.
E o vendedor de balas é feliz agora.
O vendedor de balas não se prende. Ele nasceu livre.
E se um dia ele for presidente e tiver o mesmo coração que sempre teve, ou ele dá um jeito em tudo ou vai largar, como largou tantas outras coisas.
Sendo presidente ou vendedor de balas, ele é uma das pessoas que mais admiro e amo nessa terrinha. E se eu disser "meu vendedor de balas", estarei mentindo. Ele é somente dele e de mais ninguém. Pelo menos por enquanto.
Então, eu digo apenas o que cabe cá dentro, vaza de vez em quando como agora nas lágrimas de alegria, saudade, amor, preocupação e todas as sensações que só ele sabe causar em mim: obrigada por existir!

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